Exm.º Sr. Presidente da Câmara de Lisboa,
É com muito agrado que acolho a medida que visa encerrar os estabelecimentos de diversão nocturna no Bairro Alto às 02h.
Percebo a sua revolta.
Explico a minha.
No Tempo do Bairro Alto (Fins de 80/todos os 90), também havia descontentamento dos moradores. Não poucas vezes levei, eu e os meus amigos, com baldes de água. Que caíam das janelas, num silêncio traiçoeiro, sempre no inverno ou aquando da feitura da última ganza. O que, parecendo que não, é chato! Porque ainda nos esperava toda uma rua do Alecrim, o Barco das 6h45 e o autocarro em Cacilhas.
Nesses tempos, de cada vez que o Bairro ameaçava "morrer" na sua essência, o que acabou por ocorrer nos últimos cinco anos, melhorava, só para chatear.
Foram as Docas, que serviram de íman à bimbalhada. Durante os três anos que se seguiram, o Bairro foi, na verdade, aquilo a que hoje aspira. Um sítio único. A inveja das outras capitais Europeias, mergulhadas num marasmo
mainstream. O Bairro tinha o Captain Kirk, por dEUS.
Depois, a Expo. Eles vinham de Santa Comba Dão, das periferias de Paris em autocarros com a bandeira nacional no vidro traseiro. Vinham, também, do Lumiar. Engarrafamentos de gente faminta de Daniela Mercury na Praça Sony. O Bairro, esse, brilhava. Um chá e roupa usada na Outra Face da Lua, enquanto a noite caía. Depois, logo se veria.
Pouco tempo depois, o Lux. Foi o princípio do fim. Porque o Lux também morreu. E o Bairro tornou-se "o que há". Nada de pior podia ter acontecido. Ou sim. Talvez o facto de, inacreditavelmente, os frequentadores do bairro de hoje acharem que ainda é
cool. Só duas coisas podem justificar este tipo de pensamento:
1 - Ignorância. Porque desconhecem, por esta Europa fora, o que é REALMENTE
cool.
2 - Ignorância. Não conheceram o Bairro quando este era, REALMENTE,
Primus Inter Pares.
E foi esta gente que assassinou um dos melhores sítios do mundo. Arribaram às resmas, novos, universitários. Conheci-os aos magotes. Elas nem sabiam que, aqui, já se fazia depilação. Vinham de Amarante e Fafe, deslumbravam-se com um ambiente que, contudo, já definhava, e usavam o dinheiro que os pais desviaram das suas fábricas de calçado e artigos têxtil para ROUBAREM as casas aos Lisboetas AUTÊNTICOS (sim, os sacanas que mandavam baldes de água pelas janelas). Esqueceram-se que, contudo, todos envelhecemos. E essa gente que era
munta cool e julgava os outros pelos penteados e indumentária tornaram-se pantufas, fizeram filhos e, agora, o ruído dos bares e das gentes "faz-lhes confusão". E vai de fazer petições atrás de petições.
Conseguiram.
Bem feito!
A todos os que estragaram o Bairro, os meus parabéns.
A todos os que me chamaram ISTO E AQUILO por não suportar ver, nestes últimos anos, a parada de saloios que tanto poderiam estar ali como na Day After viseense, ergo-vos os copos.
Mas de plástico, claro.
E só até às 2 da manhã.
Com o devido respeito, FODAM-SE!