quinta-feira, junho 30, 2005

Auto de Denuncia por Furto

Fui roubado e não conheço, sequer, Carcavelos. Vejo essa pseudo-betíssima localidade de uma casa que visito, felizmente, com assaz frequência, na Trafaria. Terça à noite, véspera de S. Pedro. Comprei um manjerico na feira de Sintra. Os Anjos são insuportáveis e as pessoas que sofrem de espasmos ao vê-los são piores ainda! Sigo para o Bairro Alto, que a meio da semana não costuma ser frequentado por pessoas que têm espasmos por tudo e por nada, como às sextas e sábados! Estacionámos na Rua da Trindade. Alguém nos viu a deixar as mochilas no porta-bagagens. Já com a vista turva vejo um grupo passar, na Rua de Santa Catarina em direcção ao Adamastor, com uma mochila igual à minha. Não ligo! À chegada ao carro, o vidro traseiro está aberto, o manjerico intacto mas as malas...sopa! No dia seguinte, uma senhora telefona-me dizendo que os meus documentos estavam à sua porta! Muito obrigado! Estou-me a cagar para a carta de condução. Tenho-a há doze anos e não preciso de comprovativos. Mas levo multas. Cartão de saúde, idem! Nasci em Portugal e tenho direito a ser tratado por médicos portugueses em hospitais portugueses quando precisar ou sequer pensar precisar! Registo de propriedade da mota, então, não se fala, porque paguei-a a pronto e bem! Quero é que as merdas que servem para contabilizar-nos estatisticamente se fodam. Mas foi logo o que me encontraram. Nem sinal dos três livros sobre as Sundarbans, o mapa de estradas da Índia, os três rolos com fotos dos Açores, o bloco de notas que me acompanhou na Namíbia, Botsuana e Zâmbia, o estojo de Art Pen da Rotring com que escrevi à mão os 250 convites do meu casamento e quilómetros de ideias parvas, o canivete com cabo em corno (já não se fazem) oferecido pelo meu avô, e tantos pedaços de uma vida medíocre, talvez (nunca pedaços medíocres de uma vida), mas minha! Fiquei fodido! E no Sábado de manhã vou calçar a minha botilde com biqueira de aço, dirigir-me à feira da ladra e aviar (feiamente) quem tiver em cima do pano um sequer objecto que estivesse dentro da mochila! Preto, mulato, indiano, chinês, caucasiano, fucchia, bordeaux ou pistachio, não importa! Assim como assim, nunca olhei a raças. Mas não suporto filhos da puta!

segunda-feira, junho 27, 2005

Lingua Matria

De vez em quando cometo o excesso de almoçar fora ao invés de aproveitar os escassos dois euros e qualquer coisa que o refeitório da empresa cobra por batatas fritas que o estômago não consegue digerir, perú a saber a porco, porco a saber a banha, massa com tudo e tudo com óleo. Quando o faço, tremo de pavor só de pensar que a facção feminina prefere, invariavelmente, aqueles pequenos "bistros" onde a mui dondoca proprietária decora tudo ao seu gosto pessoal, sempre campestre e amarelo e laranja e com quadros de ponto cruz e centros de mesa com gerberas e ementas atadas com sisalo e clientes betas até à medula. Eu prefiro a tasca onde o Zé Onofre diz logo: "Sai uma punheta de bacalhau ó caralho", ao "cantinho" da Sr.ª D.ª Tété Gaidão Taborda que, no outro dia, ainda com aquela cara de ressaca do Tamariz, exclamou, depois de ouvir a nossa conversa acerca da pedofilia: "Esses senhores deviam era ir todos para a cadeira electrónica".

quinta-feira, junho 23, 2005

Crise de Criatividade

Ele há para aí umas coisas - Vive La Fête, Le Tigre, etc - que diz que são boas. O que há é uma crise de criatividade bastante para tornar os anos 80, essa espécie de "monstro" até há bem pouco tempo, não o "tempo em que os animais falavam" mas ainda pior, "o tempo em que as moças usavam calças azul-cião e rosa berrante (que hoje em dia até já é "fucchia") até às canelas, botas com cano mole e descaído, franjas, permanentes, enquanto os homens puxavam as mangas (blusão incluído) até aos cotovelos e tinham penteados estilo Modern Talking e papavam as gajas todas caso se parecessem com o Limhal dos Kajagoogoo. Tornaram esse "papão", dizia eu, num poço de inspiração, inesgotável em termos de material (é só ir a uma loja de vinis que não os tenham vendido todos) e, afinal, contrariando todos os "cools" deste país que maltrataram o Variações e os Mler Ife Dada para ouvir os (som horrível, arrepiante, paupérrimo, vexante para um português) Xutos porque eram (e são) tacanhos e, como se diria no Alentejo, também ele fonte inesgotável de anedotas até se ter descoberto que um monte isolado e um jipe eram passaportes para cobrir fêmeas de parca inteligência, PATÊGOS. Pois bem, continuem todos a pensar serem "muita malucos" porque vão ao Lux e dão uns times e fumam polen em vez de sabugos, e têm amigos que metem som não sei onde e mánãsêquê e esqueçam-se por completo que continuamos FORA da rota de concertos de bandas realmente BOAS e sim, inspiradas nos anos 80. Viva o Electropop e afins, mas para quem nunca gozou ou teve problemas em assumir ter despertado para a música nessa década que foi, roam-se, um privilégio! Os Vitalic (www.vitalic.org) não vêm cá, mas quero ver quantos de vocês, "iluminatis", estarão no concerto dos Depeche Mode!

Bla bla bla Iraque bla bla bla Afeganistao...

Não! Não vou falar de assuntos Chomsky. Já todos nós sabemos que os americanos são uma praga. Um bocadinho mais gordos que os gafanhotos africanos, sim, mas de inteligência bem mais magra que um soldado-raso-nazi. Foram fideputas no Afeganistão (toda a gente sabe), fascistas no Iraque (não se fala de outra coisa), enrabados no Vietname - exceptuando o caso do Rambo - (toda a gente está careca de saber), vermes na Sérvia (já ninguém de lembra), animais no Japão (mas parece que os nipónicos é queforam uns beras do camandro com Pearl Harbour) e blá blá blá blá assunto que dava, a contabilizar mortos, estropiados e "desaparecidos", uma Torre do Tombo perpetuamente encimada por uma nuvem negra como breu! Desta feita, apenas vou transcrever mais uma pérola, retirada de um relatório da OMS (Organização Mundial de Saúde) acerca das novas doenças com que se depara o planeta: "Na época da colonização americana, um (só) comandante inglês conseguiu dizimar várias tribos de índios Pontiac e Sioux mandando simplesmente inocular o vírus da varíola em cobertores e distribuindo-os pelas aldeias". Agora façam uma busca no Google por "cobertores com vírus da varíola" e expliquem-me como raio é que é possível haver tão pouca gente a saber disto.

Desculpem mas tem de ser...

E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes

encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes

ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos

E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se envolam tantos anos.

- David Mourão Ferreira -

terça-feira, junho 21, 2005

Jogo de crianças

Quando a malta era criança, no tempo em que já os livros d'Os Cinco, do Petzi e da Anita eram uma boa seca (hoje em dia seriam muito mais interessantes com "Petzi e Amigos Entram num Gang Bang" ou "Anita Toma Uma Pastilha"), ainda iniciávamos a brincadeira com o "eu sou dos bons e tu és dos maus", ou vice-versa consoante as preferências. Fazia-me espécie quem preferia "ficar dos maus", mas vim a percebê-lo mais tarde. Os maus eram os índios. Sempre os índios. Podiam ser os ciganos, os pretos, os timorenses, os alentejanos, os tripeiros, os retornados ou a malta de Santa Comba Dão, terra maldita do panasca pencudo, mas não! Sempre os índios, esses malvados! Valha-nos o facto da lavagem cerebral de Hollywood (ainda hoje vigente) não ter chegado ao ponto de começar a ser celebrado em Portugal o Dia de Acção de Graças, que toda a gente sabe que existe (mais uma vez, Hollywood), mas poucos sabem o que seja.
De qualquer forma, quando a matança de índios deixou de ser "politicamente correcta", alguém inventou um remédio capaz de "curar" várias maleitas, já de si causadas pelos colonos... Morreram índios que nem coelhos em tempo de peste. Algum tempo mais tarde, alguém teve a mesma ideia mas adaptada ao desenvolvimento científico do Século XX. E morreram larilas e fufas e pretos em África que nem focas no Canadá. Agora dizem que a culpa foi dos macacos. Abram-me esses olhos!

segunda-feira, junho 20, 2005

Pior é SEMPRE possivel

Enquanto degustava, num Clube Recreativo (que é, como todos sabemos, um belo local para uma descida aos infernos em jeito de viagem etnográfica) adocicadas zurrapas que servem para abrir o apetite para o resto da noite, observava um jovem com uma das mais expressivas perplexidades olhando para a televisão, onde um casal degladiava argumentos em relação a uma suposta traição com pronúncia brasileira. "Fiel ou Infiel", estava escrito no canto inferior esquerdo do ecrã. O rapaz continuava agarrado à "mini" (Sagres, a autêntica), de olhos pregados naquilo, e a única vez que o vi fechar a boca foi para quase sussurrar de si para si: "Batemos no fundo".
Eu, como todo o tuga, "meti conversa", mortinho por rematar com aquilo que eu considerei ser a "punch line" da noite: "Isso era o que toda a gente dizia quando apareceu o Big Brother, há três anos atrás".
É então que alguém avança os canais num zapping frenético e deparamo-nos todos com a Júlia Pinheiro a falar com uma peúga.

sexta-feira, junho 17, 2005

Criar e pensar que sim

"É certo que ninguém pode gozar de todas as faculdades do espírito senão quando se desembaraça dos cuidados materiais da existência - o que só é possível nos países onde os ofícios e as ocupações materiais são exercidas por escravos". Quem o disse, acertadamente, foi Chateaubriand. Quem o nega é burro! Esta é a civilização criada nestes moldes desde os gregos, e somos todos cúmplices. Incluíndo todos os que pensam que por vestir assim e frequentar sítios assado fazem parte dos que criam e não dos que fazem a engrenagem mover. Patos!
Mexam-se!

quinta-feira, junho 16, 2005

Mau Começo, ou O Primeiro Post e o Bicho da Pagina Em Branco

Dizia um que "A Vida É Um Milagre", em servo-croata, num dos piores filmes da sua cinematografia, exceptuando talvez a banda sonora. Mas outro havia que dizia, a páginas tantas dum livro mal-amado, na fala de Marta, irmã de Lázaro, prestes esta a presenciar o acatamento à ordem: "Levanta-te e caminha até mim", que "Ninguém cometeu tantos pecados em vida que mereça morrer duas vezes".