Portugal sofre de um síndrome gravíssimo.
De entre tantos sinais, escolho a histórica evidência de sermos um país de poetas sem apreciadores do género.
Camões, coitado, morreu na miséria, ao que se sabe. Pessoa vagueou pela baixa, passando despercebido como qualquer outro transeunte no Grandella. Mais tempo demorasse a morte a levá-lo, mais tarde teriam encontrado o baú com os seus escritos. O O'Neill também se finou sem conseguir fazer com que o Instituto dos Socorros a Náufragos lhe pagasse o "Há mar e mar, há ir e voltar". Ser poeta contemporâneo português é um estado miserável. Aposto que todos os poetas contemporâneos portugueses gostariam de ser poetas clássicos portugueses, mas já, a tempo de ganhar algum dinheiro com o dom!
Quanto tempo será preciso, por exemplo, para que o Nuno Marques passe a clássico? A Naifa já fez a sua parte. E nós? Vamos todos ver um dos dois concertos dos Xutos no Campo Pequeno, não é??? Pois é!
"Tenho uma estátua fluorescente da Virgem
Maria que me dá confiança e brilha à noite.
Tenho os joelhos magoados. O calvário dos fiéis
devia ser menos árduo.
Tenho trezentos e sessenta e cinco santos numa
caixa-calendário daquelas em que cada dia
tem um chocolate.
Tenho um lencinho branco onde limpo as
lágrimas enquanto assisto a uma vigília via TV,
depois da minha última ceia de hoje.
Às vezes quando o vapor é muito, tenho o
Salvador no espelho. Deito-me de consciência
limpa, não me esqueci das velinhas, nem de
deixar a moedinha na caixa, e o meu "livro de
orações" tem um delicioso cheiro a mofo.
Dormirei o sono dos justos e talvez não acorde
quando o galo da minha vizinha cantar três
vezes e o meu senhorio o tentar apedrejar.
Sinto-me bem e Deus queira que consiga não
me masturbar.
Ámen."
1 comentário:
Porreiro, pá!
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