Penso que não há lenda da música cuja estória não tenha sido escamoteada em filme, livro ou documentário.
Mas este facto só o é porque Nick Cave não se inclui no saco.
É Lenda, mas só para alguns.
Porque não é fácil, reconheço.
Eu tenho uma relação muito especial com o legado do Senhor.
E tenho-o como maior que os outros todos porque, enfim, Thom Yorke e Jarvis Cocker ainda não têm idade para estar no mesmo patamar icónico.
Haveria, no entanto, lugar à exploração da história caveiana sem sequer ser necessário romancear o que o levou aos dias de hoje com uma obra tão consistente como impossível de ignorar, se bem que numa vereda paralela (e por vezes bem afastada) à contemporaneidade do rock (ou lá o que seja).
Sucintamente, os Birthday Party vieram de Melbourne para Londres a fim de dar alguns concertos a uma audiência que ainda não assumira o desapego ao punk para estar a levar com pós-punk. O resultado foi muita fominha e heroína até que, um belo dia (ou não, tendo em conta que falamos de Londres), mais propriamente uma noite de 1983, no Electric Balroom, Cave abre com o agora mítico brado (que abre o tema Sonny's Burning) Hands Up Who Wants to Die e pouco menos de mil braços na sala obedecem, abrindo alas para a indelével imagem de um pregador da verdade, muitas vezes demoníaca, que o Australiano Mestre ainda hoje carrega em ombros.
Foi o pouco que faltava para os quatro objectos que se seguiriam e que eu considero obrigatórios na discografia de quem é, no mínimo, interessado... porque é uma qualidade humana que inviabiliza quaisquer preferências e preconceitos.
São pois From Her To Eternity (1984), The Firstborn Is Dead (1985), Kicking Against The Pricks (1985) e Your Funeral, My Trial (1986), que daqui a mais ou menos um mês estarão nas lojas, remasterizados.
É uma excelente oportunidade para se ter acesso a um oásis que brilhou, a par com outros (poucos), nesse deserto criativo que foram os 80's.
Para quem dispõe de uma mente suficientemente aberta, será óbvio que os primeiros álbuns de Nick Cave And The Bad Seeds eram, pois, semente de algo grandioso.
Os mais sensíveis não poderão evitar o arrepio na espinha produzido ora pelos incontornáveis efeitos de Blixa Bargel, ora pelas guitarras de Mick Harvey, ora pelo avassalador lirismo do piano ou Hammond de Cave, suas letras transpostas de todo um imaginário (bem) presente de E O Burro Viu O Anjo, e, claro, a sua voz, mensageira de algo Maior, como se o Apocalipse estivesse marcado para quando a agulha se erguesse do vinil preto, imagem derradeira antes do FIM!
1 comentário:
pois que sim.
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