Dei boleia ao Damas, um louco que de menos louco tem o facto de ter escolhido as imediações do Intendente para morada, dividida com mais uma espanhola e o seu namorado, para desespero do rapaz, que come avidamente tortilhas no refeitório da Empala para depois ter assunto de conversa: "Que ái comido una tortilla y que estava muy buena, pá"!
São quase 23h no Martim Moniz (menos uma hora no arquipélago dos Açores) e o homem expele um: "Os espanhóis dizem-me que há por aqui um restaurante chinês clandestino". Quais McGuyvers que, caso necessitassem de um clip no meio do deserto do Namibe encontrariam-no, passam por nós dois indivíduos de olhos rasgados. Perguntamos pelo sítio. Somos submetidos a um extenso inquérito, ninguém gosta de colocar os seus em risco. Enfim, o facto de não termos bigode nem blusão de cabedal joga a nosso favor e depois de um derradeiro: "Foi vossos amigos que falalam do sítio?", lá o seguimos pelo beco. Apontou o segundo andar e depois de consultar atentamente os caracteres que figuravam em autocolantes junto das campaínhas, tocou. A porta abre-se. Subimos. Passa por nós a correr mais um chinesito. Leva uma trotineta e entra na mesma casa que nós. Uma casa. Mesmo. Quatro mesas. Duas delas ocupadas (cada uma) com dois portáteis sobre os quais se inclinam, por sua vez, dois chinocas na faixa etária dos vinte. Consigo, apesar dos caracteres que inundam o ecrã, adivinhar o chat e a wikipedia. Não cheira a comida. Nas paredes não há quadros com pandas e bambús. Mas há pelo chão brinquedos, uma aranha e um carrinho de bébé. A varanda está aberta. É para lá que vou fumar, não consigo afastar a noção de que estou na casa de alguém que ainda por cima tem uma criança. Oferecem-me um cigarro. Na varanda há um vaso que não tem sardinheiras. Parecem-me alhos. Vem a ementa. Duas micas de plástico agrafadas encerram um admirável mundo novo: tripa de porco caramelizada, caranguejo envinagrado, patas de galinha e pato. Também está redigido em português. Estranho o facto. Quando tentamos pedir, percebo que estava a ser optimista. O problema de comunicação resolve-se. O senhor retira-se para a cozinha, aberta, visível, acessível até, um dos "nerds" dos laptops retira do frigorífico, ali ao meu lado, as cervejas e eu vejo, no ecrã (chat), alguém que lhe mostra o decote. Começamos a ouvir o característico shshsh das frigideiras. A televisão transmite uma espécie de Oprah em mandarim e, à saída, um bloco noticiário com desavenças entre deputados na Ilha Formosa, perante a zombaria dos presentes. Massa de arroz com caril, camarões, pimento e uma espécie de bacon, frango cozido a vapor e servido frio, arroz, quatro cervejas, bolinhos de arroz, sementes de sésamo e coco (quentes), €16. A punchline reside no facto de este não ser o "restaurante" de que o casal espanhol falava. Esse outro só tem um velhote, que depois de cozinhar e servir senta-se no sofá e adormece, deixando à vontade (por vezes até às duas ou três da manhã), os convivas.
7 comentários:
1º Parabéns pela boa descrição dos acontecimentos
2º é preciso dupla coragem para uma aventura dessas, para andar por zonas desconhecidas e labirinticas e por se atreverem a comer sabe-se lá o quê.
3º Lisboa é pequena mas nunca deixa de nos supreender.
4º Ficámos sem saber se a comida é boa.
5º Acho que prefiro continuar a ir ao Chinês do casino, nuna vi nem sei se a cozinha é limpa ou não, mas a comida é excelente e nada como os crepes deles que ainda hoje mandei vir 6 para o almoço
Ah, foste com o Damas? Então e não serviram , com a aguardente de lagarta, um livrinho do Mao? Cuidado com esses vermelhuscos, capitalistas não assumidos
aposto que não há gatos nas redondezas...
O que tu querias sei eu...
Com que então foste aos pioneses comer. E foi uma experiência boa ou nem por isso?
Olhando para a foto... agora já sei o que levas no bolso quando vais cortar o cabelo. Deve ser do género:"Ah e tal, apare-me aqui a gadelha como George Harrison!"
O Damas é uma pessoa muito especial.
fónix, ZORZE!!! Que espécie de comentário é este, pá??? Ah eu é que tou queimadinho???
Especial é a cerveja dos Açores, pá! O Bruno é mazé um louco!!!! Só que eu curto-o! Tenho dificuldade em lidar com humanos!
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