Estão -10ºC que me agitam a bexiga em perpétua vontade de urinar e nervoso miudinho por saber que, para o fazer, vou encontrar um mais-que-nunca diminuto Zezinho em mirrada agonia invernil. De queixo e nariz dormentes, faço lembrar (a mim mesmo) aqueles petizes que vêem o Barco Pirata da Playmobil na montra e nunca mais se calam Eu quero Eu quero Eu quero, só que os meus desejos são bem mais humildes Eu quero apenas um café e um cigarro a acompanhar. O guia não me ignora como um pai de carteira menos abonada, a pensar como há-de contornar o pedido e subsequentes expectativas com o Carro de Polícia da Playmobil, substancialmente mais barato, antes a sua expressão compenetrada é acompanhada por um Se queres tirar fotografias a lugares aprazíveis e bem decorados tenho que te levar ao lugar perfeito. Ainda não sei é qual será! Eu, sequioso de cafeína, nicotina e mais uma ou outra ina que para aqui não serão, por ora, chamadas, limito-me a olhar pela janela do carro que atravessa, como um barco num mar de branco, o vale, neve a estibordo, neve a bombordo, ambos os bordos elevando-se um pouco adiante em montanhas tão altas que o sol só aparece entre as 12h30 e as 16 e qualquer coisa, encostas forradas de pinheiros, coníferas feitas manto que apetece pisar, não para estragar mas para sentir o flóft debaixo dos pés. Indetectável, camuflada no meio desse voraz bosque que a parece ter engolido, uma hut ou cabana, vá, de madeira, um fio de fumo que se ergue na vertical porque aqui o vento é nulo só para chatear, permitindo que o frio abata sobre nós em golfadas vindas dos cumes, e digo Que espécie de eremitério é aquele? E rasga-se no fellow que vai ao volante um sorriso acompanhado de um Grande ideia! E eu que não sabia onde levar-te! Aquilo é o Ensiedelei, um restaurante de um amigo meu. E era! Daqueles em madeira por dentro e por fora, uma capela ao lado, promessa de alguém que chegou vivo da cruzada contra os Turcos, onde se arriba por uma estrada sinuosa, que rasga um bosque cerrado, tudo é branco e preto, uma raposa e um veado depois estamos lá, inigualável varanda sobre Kitzbühel, muito lá em baixo, como uma maqueta de arquitectura de um espertalhão finalista da Lusíada Este é o meu projecto de final de curso, xô prussôr, um lugarejo no fundo de um vale entre os Alpes Austríacos, com poucos milhares de habitantes, todos se conhecem, casas de madeira, ali ao fundo um lago, o Schwarz-see, que gela no Inverno, as encostas cobertas de coníferas que evitam as avalanchas, uma Primavera feita de verde-infinito e mantos de groselhas, mirtilos e solitárias edelveisses, ou lá o que é, que eu quero é ser arquitecto porque os botânicos não andam de BMW!
Entramos. Está quente. Como em todo o lado que não seja o lado de fora. Só há 3 pessoas. Pinky, o dono, Alex, o filho e uma lindíssima loira de sua graça Marie Therese, 32 anos que sucumbiram à boa disposição — e outros atributos que desconhecerei — dos 45 de Pinky, personagem bem conhecida por estas bandas, sorriso rasgado e um humor inteligente, prazenteiro, de anfitrião à antiga. Benvindo à minha cabana na floresta, troveja este grandalhão, quase uma caricatura, com os seus lederhosen de infante em corpo de wrestler. Trabalhou como chef da Formula One Paddock Club durante 10 anos, mais alguns na Red Bull Racing e acabou aqui, no meio do bosque, a fazer o que faz melhor, gastronomia tirolesa. Que vai bem com hospitalidade montesa. Queres café??? Mas isso é para meninos, pá! Bebes já aqui um glühwein (vinho tinto quente com canela e laranja) ou uma Água da Montanha (Schnapps) e não há frio que se te pegue. O dIAZ, que está, como convidado, à altura do melhor cicerone, lá foi provando disto e daquilo, ficou a saber que a alcunha Pinky se deve ao facto desta figurinha gigantesca se passear, em tempos, numa Piaggio Vespa 150cc de dois selins igual à minha mas cor-de-rosinha, riu e re-riu como se não houvesse amanhã e, a haver, não seria tão frio, e foi-se embora pouco depois de Pinky ter dito qualquer coisa como Mas vais mesmo tirar-nos uma foto para a revista? De família? Assim tipo retrato? Não queres antes tirar só à minha namorada? É que ela é que é gira, pá, tipo modelo, olha lá para ela, vá. Olhei. E, não sei se pelo entorpecimento do álcool, demorei-me um pouco mais do que devia... para ouvir, num quase sussurro E então? É bom, não é? Queres ver-lhe as mamas? Eu digo-lhe...
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