segunda-feira, julho 31, 2006

Nestes Tempos Que Se Atravessam...

...de um Patriotismo Bacôco, que é como quem diz Nacionalismo nú e crú, que é como quem diz na sua pior forma, com bandeirinhas rotas e descoloradas indexadas a uma equipa que pratica um futebol que desperta em nós o enfado, apetece-me citar Jorge de Sousa Braga e imaginar o poema "Portugal" no seu mais denso potencial, isto é, dito pelo Mário Viegas (outra vez o Mário Viegas e sempre o Mário Viegas)...

"Portugal
Eu tenho vinte e dois anos e tu às vezes fazes-me sentir como se tivesse oitocentos
Que culpa tive eu que D. Sebastião fosse combater os infiéis ao norte de África
Só porque não podia combater a doença que lhe atacava os orgãos genitais
e nunca mais voltasse
Quase chego a pensar que é tudo mentira, que o Infante D. Henrique foi uma invenção do Walt Disney
e o Nuno Álvares Pereira uma reles imitação do Príncipe Valente

Portugal
Não imaginas o tesão que sinto quando ouço o hino nacional
(que os meus egrégios avós me perdoem)
Ontem estive a jogar poker com o velho do Restelo
Anda na consulta externa do Júlio de Matos
Deram-lhe uns electro-choques e está a recuperar
àparte o facto de agora me tentar convencer que nos
espera um futuro de rosas

Portugal
Um dia fechei-me no Mosteiro dos Jerónimos a ver se contraía a febre do Império
mas a única coisa que consegui apanhar foi um resfriado
Virei a Torre do Tombo do avesso sem lograr encontrar uma pétala que fosse
das rosas que Gil Eanes trouxe do Bojador

Portugal
Se tivesse dinheiro comprava um Império e dava-to
juro que era capaz de fazer isso só para te ver sorrir

Portugal
Vou contar-te uma coisa que nunca contei a ninguém
Sabes
Estou loucamente apaixonado por ti
Pergunto a mim mesmo
Como me pude apaixonar por um velho decrépito e idiota como tu
mas que tem o coração doce ainda mais doce que os pastéis de Tentugal
e o corpo cheio de pontos negros para poder espremer à minha vontade

Portugal estás a ouvir-me?
Eu nasci em mil novecentos e cinquenta e sete, Salazar estava no poder, nada de ressentimentos
o meu irmão estava na guerra, tenho amigos que emigraram, nada de ressentimentos
um dia bebi vinagre, nada de ressentimentos

Portugal depois de ter salvo inúmeras vezes os Lusíadas a nado na piscina municipal de Braga
ia agora propôr-te um projecto eminentemente nacional
Que fossemos todos a Ceuta à procura do olho que Camões lá deixou

Portugal
Sabes de que cor são os meus olhos?
São castanhos como os da minha mãe

Portugal
gostava de te beijar muito
mas mesmo muito apaixonadamente
na boca"



O meu amigo Gijó passeia os seus três amigos com o devido pedigree (registados na Câmara Municipal da Chamusca como Gil Eanes, D. Sebastião e Velho do Restelo), numa manhã de nevoeiro...

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